"O que é que o senhor deseja?"
"Sim, senhor!"
"Desculpe, senhor..."
Enfim, há todo um sem número de ocasiões sociais em que a expressão "senhor" pode ser, e bem, utilizada.
Mas como é que se define o momento de obtenção desse estatuto? Existirá algum ritual que celebre a passagem de jovem a homem?
Há por aí quem opine que esse momento corresponde ao primeiro deslizar da Gillette sobre o rosto. Contudo, tendo em conta que já tenho visto senhoras a utilizar semelhante método para debelar a penugem facial, parece-me que o tenho de pôr de parte como rito de iniciação (exclusivamente) masculino.
Em algumas culturas ancestrais era pedido aos jovens que passassem uma noite o uma semana sozinhos na selva, com o mínimo indispensável à sobrevivência. Poderíamos tentar oficializar um ritual de passagem que consistisse em algo semelhante, como enviar os "candidatos a homem" a passar uma noite na Cova da Moura com um telemóvel de última geração. Apenas os que o conseguissem conservar ou que apresentassem menor quantidade de marcas de violência, seriam os vencedores.
Infelizmente, não há um acontecimento comum a toda a comunidade masculina que marque de forma inequívoca a obtenção do estatuto de senhor. A minha teoria é que cada um vive um determinado momento que lhe confere uma postura perante o mundo totalmente diferente.
O meu momento foi hoje.
Antes de avançar com pormenores, devo referir que, por preguiça e gosto, cultivo uma barba de tonalidade arruivada (graças ao duvidoso sentido de humor da natureza).
Hoje, após um exame de 2 horas, desloquei-me da faculdade até um pequeno estabelecimento estético destinado ao público masculino, vulgo barbeiro. Não era a primeira vez que atravessava a porta entreaberta e pisava uma quantidade apreciável de cabelos, antes de me sentar na cadeira a ler o desportivo do dia.
Também não foi a primeira vez que
-Barba e cabelo!
Contudo, foi a primeira vez que o senhor a quem tão prontamente confio o meu pescoço em questões de "aparagem" de barba e os seus colegas me incluiram nas suas divagações de cariz extra-profissional.
Começaram pelo futebol, desancando fortemente no Ricardo ("esse cabr*o é que nos f*deu à grande"). Atrevi-me a imiscuir-me na conversa, insinuando que faltavam lá jogadores do Benfica. Milagre, já fazia parte do grupo. Não podia era revelar o meu sportinguismo, a troco de ganhar um corte inestético na jugular.
Passámos então a falar das moças que passavam na rua. Não vale a pena entrar em pormenores sob o aspecto que apresentavam, é Verão e estavam 4 homens a olhar, quem não quiser entender que leia uns posts abaixo.
O que é certo é que o à vontade com que falavam em comer jovens com idade para serem suas netas me deixava um pouco assustado.
-Ainda agora saiu da casca e já anda descascada!
-Não me importava de lhe ensinar umas coisas.
Perante este tipo de afirmações, limitei-me a anuir. O nível da conversa foi atingindo níveis cada vez mais baixos, típicos de benfiquistas, até que o senhor que me aparava a barba, enquanto passava o pincel numa tina de algo longinquamente semelhante a água, num gesto de lucidez exclamou:
- Velhos de merda. São uns velhos de merda e só querem comer novas.
Genial, simplesmente genial.
Ri-me apenas o suficiente para não criar ali nenhum possível Sweeney Todd e deixei que o velhote acabasse de me acertar a barba, enquanto os outros se riam ao ver na pequena televisão adeptos turcos à porrada com checos.
Saí do barbeiro com um visual mais arranjadinho e com a moral em alta. Depois disto, sou um Senhor!
Um comentário:
Já alguma vez te disse que escreves muito bem ?
Não ? Ok ...
Escreves muito bem :'D
E eu gosto da tua barba ;D
Imp. **
Postar um comentário