segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Página em branco

Atrofia-me ver páginas em branco no meu caderno. Sim, para quem não sabe, ando normalmente com um caderno onde vou escrevendo parvoíces, ideias, histórias, merdas... enfim, o que quer que me apeteça.

Não tenho uma afeição especial por ele. Não saltaria de um navio para o salvar. Não é o meu melhor ou mais fiel amigo. Mas dá-me um certo gozo utilizá-lo.

Chamem-lhe mania, mas só escrevo nele com uma caneta que me ofereceram há uns anos, mas que nunca escreveu até uma salvadora se ter lembrado de me oferecer uma carga. É uma Parker normalíssima, vulgar até, mas é o complemento necessário ao funcionamento do caderno.

Pedindo desde já desculpa pelo cliché foleiro, devo confessar que, ultimamente, estes têm sido, literalmente, os meus companheiros de viagem. É rara a travessia ou espera de autocarro em que não tire da mochila o material e comece a escrever o que quer que seja, mais por aversão às páginas em branco do que por qualquer tentativa de me armar em escritor.

Porém, preencho páginas e páginas com frases a vulso. Expressões bonitas, às vezes gramaticalmente correctas, com sentido, mas sem ligação. A metáfora que primeiro me surge à cabeça para explicar isto é que sou um "qué frô?" da escrita. Distribuo frases, agradáveis à vista, prendas bonitas, mas efémeras. Por mais viçosa (yeah, sure) que seja a flor que os imigrantes indianos vendem, ao fim de poucos dias murchará e perder-se-á para sempre. Falta-lhe a ligação, falta-lhe a segurança de uma raiz e de dezenas de folhas a trabalhar para a sua sobrevivência.

Folheio o meu caderno e só encontro palavras errantes. Um parágrafo, relativamente curto, que, embora fazendo sentido, se encerra em si mesmo, desprovido de qualquer linha de continuidade.

Numa analogia futebolística (dentro em breve surgirão umas interessantes, vão estando atentos), posso dizer que é como ir a um jogo de futebol só com o Maradona na equipa. Por mais brilhantes que sejam os segundos em que a bola baila nos seus pés, nada poderá ser construído e a derrota... é inevitável.

Contudo, para quem só se interessa por acabar com as páginas em branco, está muito bem assim.

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